segunda-feira, 2 de novembro de 2009

"Traga sua Dor"


Em um domingo de outubro estava passando em frente ao mercado pilotando uma moto. Embora concentrado no trânsito, não pude deixar de ouvir perto um vendedor de pomada de copaíba. O que prendeu a minha atenção e de muita gente que se aglomerou em torno do seu carro de som foi sua propaganda. Entre outras coisas, o vendedor afirmava com convicção: "Venha, traga a sua dor que ela vai passar. Traga qualquer dor que ela vai passar. É só usar a pomada. Pode trazer qualquer dor que em poucos minutos ela vai sumir."

Para reforçar ainda mais seu argumento ele desafiava: "Se sua dor não passar pode me procurar na pousada... (dava o endereço do hotel) que eu devolvo o dinheiro." Entre as dores que prometia curar com a pomada estavam "dor de cabeça, dor do reumatismo, dores nas costas, nas pernas e qualquer outra dor." Quando uma senhora lhe perguntou se seu reumatismo seria curado ele confessor com sinceridade: "Senhora, a pomada vai fazer passar a dor do reumatismo, mas curar a senhora do reumatismo não. A dor de cabeça vai passar, mas a enxaqueca vai permanecer," disse para outro.

O vendedor seguiu por toda aquela manhã de domingo vendendo seus produtos e eu pensei nesse dia sobre os atuais pregadores de milagres. Aqueles que, com muita fé, dizem para as multidões: "Não importa qual seja a sua doença, traga a sua dor que nós curamos. Entre e nós vamos orar por você e a sua dor vai passar. Se não passar você pode me chamar de mentiroso."

Infelizmente, poucos pregadores do evangelho da prosperidade são sinceros como o vendedor de pomadas. Eles não admitem: "Amigos, a minha oração vai passar de forma momentânea a sua dor, mas a sua doença vai permanecer. A sua emoção e êxtase vão fazer você parar de sentir as dores da sua doença, mas ela continuará, na maioria dos casos, com você."

Mas uma coisa é certa, igual que o vendedor, eles não fazem a obra de milagres de graça. Para repartir a pomada que sara qualquer dor, existe uma taxa a ser paga para a igreja. A pomada do domingo custava dois ou três reais (não me lembro) e a oração nas igrejas pode custar dez, cinqüenta, cem ou até mil reais. Tudo depende da sua fé e do seu saldo na conta bancária ou talão de cheques na hora do culto.

Embora existam verdadeiros missionários cheios de fé que oram pelos enfermos sem nenhum tipo de interesse nas suas ofertas ou dízimos ou filiação a denominação, um bom número hoje faz outra obra.

Como o vendedor de pomadas procurou a periferia da cidade, os pregadores populares procuram normalmente os menos esclarecidos. As curas das doenças e os milagres para melhorar a qualidade de vida são apresentados como resultado dos donativos oferecidos. (Alberto Timm, Revista sinais dos tempos, janeiro-fevereiro de 2002, Tatuí, São Paulo: Casa Publicadora Brasileira, pág. 30). Quanto mais ofertas você der (ou pomadas comprar) mais bênçãos na forma de curas vai receber. Essa é a filosofia de muitos pregadores que mais poderiam ser chamados comerciantes das bênçãos divinas. Nem Jesus nem seus apóstolos solicitavam qualquer donativo após curarem doentes ou realizarem outros milagres. (Ibid.) Outra coisa importante a ser lembrada é o fato de que Jesus, ao contrário dos atuais pregadores de milagres, normalmente convidava as pessoas a uma experiência de comunhão e entrega e não apenas lhes chamava para realizar milagres em seu favor (ver Mateus 11:28).

Foi a tais pregadores que o apóstolo escreveu: "Porque nós não estamos, como tantos outros, mercadejando a palavra de Deus; antes, em Cristo é que falamos na presença de Deus, com sinceridade e da parte do próprio Deus." (II Coríntios 2:17)

Ribamar Diniz (Bacharel em Ciências da Religião e Estudante de Teología na Universidade Adventista da Bolívia)

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